A melhoria da qualidade dos produtos agropecuários é um desafio permanente para agregar valor às mercadorias e promover o desenvolvimento das pequenas propriedades rurais. Em todo o estado, os agricultores vêm recebendo apoio do Programa Rio Rural para tornar mais sustentáveis seus sistemas produtivos, através da adoção de boas práticas.
Exemplo de sucesso no processo de transição agroecológica, o produtor Fábio José Alves, da microbacia do Ouro, em Porciúncula, no Noroeste Fluminense, foi um dos primeiros a obter a certificação de agricultor orgânico na região. Há cerca de cinco anos, Fábio, que cultiva café e olerícolas, recebeu apoio técnico e financeiro do Rio Rural para adotar práticas agroecológicas. Com os incentivos, ele começou a usar em suas terras a adubação orgânica e a adubação verde, duas técnicas que contribuem para aumentar a saúde do solo. O agricultor abriu também canais de contenção e caixas de captação de água, para evitar a erosão e a perda dos nutrientes e da umidade.
“Tinha problemas que não enxergava. No começo, eu jogava o adubo e a chuva levava. A erosão ia assoreando o açude. Se eu não preservasse, não teria água para o consumo, para lavar o café, para o tanque de peixes”, conta o agricultor, que também protege duas nascentes em sua propriedade de 13 hectares.
As práticas incentivadas que ele passou a utilizar desde então, por conta própria, foram o pontapé em um processo de melhorias que levou o agricultor a obter certificação de sua produção de hortaliças, junto com outros 97 produtores da região. A qualidade orgânica é garantida por Organismo de Controle Social (OCS), modalidade reconhecida pelo Ministério da Agricultura que se baseia na interação, participação e relação de confiança entre produtores e consumidores. Com o certificado, os agricultores podem vender seus produtos no mercado institucional (PNAE e PAA) e em feiras.
O próximo passo, segundo Fábio, é conseguir a certificação também do café que produz, sem agrotóxicos, e vender no mercado local. Além da melhor qualidade e diferenciação dos produtos, o agricultor tem motivos de sobra para investir nos orgânicos. “A sustentabilidade é a minha alforria de um sistema que nos faz dependentes de insumos a preços que não estão sob nosso controle, e que nos obriga a vender a produção como commodity. Hoje só consigo viver aqui porque diminuí à metade meus custos e melhorei a qualidade do café”, afirma o produtor.
A grande preocupação de Fábio, no entanto, é com a saúde e a vida de sua família. “Todo dia em que eu mexia com agrotóxicos, me intoxicava, tinha náuseas, ficava de cama. De dois anos para cá, nunca mais precisei tomar remédio para o fígado, nem passei mal por conta disso”, conta o agricultor, que perdeu o pai de 38 anos para o câncer e hoje vive com a esposa e dois filhos. “Meu pai e avô usaram agrotóxicos a vida toda e os dois morreram precocemente. Minha mãe ficou sobrecarregada, tendo que cuidar dos quatro filhos. Desde criança eu percebi que havia algo errado, mas não tinha como lutar contra isso”, lembra.
Hoje, a situação da família de Fábio é totalmente diferente. “O impacto social que esse programa teve na minha vida foi muito grande. Meus filhos sabem diferenciar que pode e o que não pode ficar no solo, sabem a diferença entre uma casca de laranja e uma sacola no ambiente em que vivemos”, orgulha-se.
Rede de Pesquisa apoia práticas agroecológicas
No caminho da sustentabilidade, Fábio não está sozinho. Ele faz parte da Rede de Pesquisa, Inovação, Tecnologias e Serviços Sustentáveis em Microbacias Hidrográficas, articulada pelo Rio Rural para capacitar e incentivar agricultores no estado. Ele conta também com o apoio do Sebrae-RJ para desenvolver o Sistema de Produção Agroecológica Integrada e Sustentável (PAIS), utilizado em sua produção de hortaliças.
Com o conhecimento adquirido na rede, o agricultor ampliou as práticas sustentáveis e tornou mais saudável toda a produção. “Aprendi a manejar o solo, como manter a cobertura, produzir caldas e o adubo bokashi. Tudo isso faz com que minha lavoura sofra menos com o estresse hídrico e as plantas sejam mais saudáveis, resistindo melhor à seca e às pragas”, explica.
Na lavoura de café, Fábio faz adubação verde, semeando espécies como a crotalária e a mucuna preta, além de consorciar com o cultivo de feijão. Essas plantas são leguminosas que melhoram a estrutura do solo e contribuem para fixação de nitrogênio, um dos principais nutrientes necessários à atividade agrícola. Ele mesmo produz as sementes utilizadas, diminuindo ainda mais os custos com insumos.
Novos projetos
Os bons resultados na lavoura estimulam o produtor a seguir em frente, melhorando a cada dia a produção. No momento, estão em fase de elaboração dois novos projetos em que ele será beneficiado. Um deles é o sistema agroflorestal, que combina o cultivo de frutíferas com espécies nativas, aumentando a diversidade biológica e a cobertura verde na propriedade. O segundo é um projeto grupal que beneficiará quatro produtores com a aquisição de secador de café e instalação de um galpão de armazenamento.
De acordo com o técnico executor do Rio Rural, Ademir das Virgens, que presta assistência técnica na microbacia, o equipamento representa ganhos significativos, porque tem impacto na qualidade de produção. “No terreiro, o café leva de 20 a 25 dias para secar, enquanto no secador, em 40 ou 50 horas já está pronto para a venda, sem perda de qualidade por causa dos fungos ou bactérias. Com isso, os produtores conseguem de 150 a 200 reais a mais por saca de café, além de economizarem com mão de obra”, explica o extensionista rural.
A microbacia do Ouro possui 528 agricultores e foi a primeira trabalhada pelo Rio Rural em Porciúncula. Até o momento, R$ 327 mil foram investidos na localidade em incentivos à adoção de práticas sustentáveis, de um total de mais de R$ 1,3 milhão liberado para as microbacias do município.